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Delegada defende educação como arma de combate à violência contra a mulher
por Bruno Giannini em 17/07/2018 Ela nasceu e foi criada em Nova Odessa; passou a adolescência em Cosmópolis (cidade onde vive até hoje); se formou em Piracicaba; atuou como delegada em Barueri, na grande São Paulo e passou por Holambra. Desde 2017, é a titular da Delegacia de Jaguariúna – fato que a coloca em evidência, já que, até então, as mulheres que ocuparam o cargo na cidade, o exerceram de maneira temporária. Casada e mãe de uma filha, Juliana Belinatti Menardo, concedeu entrevista ao Estrela da Mogiana. Entre várias coisas, ela contou sobre a dinâmica de trabalho da Polícia Civil e opinou sobre sua visão em relação às políticas públicas de segurança voltadas à mulher.Estrela da Mogiana - Fale um pouco sobre sua história de vida profissional?
Juliana Belinatti Menardo - Exerci a advocacia por 10 anos, advoguei no campo do Direito Público, com ênfase em Direito Tributário, junto à Prefeitura Municipal de Cosmópolis. Em 2011, fui aprovada no concurso público para ingresso na carreira de Delegada de Polícia do Estado de São Paulo e na Academia de Polícia Civil conquistei a 8ª posição dentre 200 aprovados.
Estrela da Mogiana - E o início efetivo da carreira, como ocorreu?
Juliana Belinatti Menardo - Iniciei a carreira como Delegada de Polícia Plantonista, na cidade de Barueri e já em 2013 assumi a titularidade de Delegada de Polícia de Holambra, permanecendo neste cargo até 2017. Neste período, atuei também como Delegada responsável pelo expediente da Delegacia de Defesa da Mulher de Mogi Guaçu. No final do ano de 2017, em promoção à carreira, assumi a titularidade da Delegacia de Polícia de Jaguariúna onde estou até hoje.
Estrela da Mogiana – Já sofreu algum preconceito, ou seja, já foi vítima de atitudes machistas por parte de colegas de profissão?
Juliana Belinatti Menardo - Não. Antigamente havia muito esse preconceito com a mulher, mas agora vejo que há até uma certa proteção (dos policiais mesmo). Na hora de atuar eles tem um jeito peculiar, protetor até, de falar com a mulher. Essa questão do preconceito está mudando bastante.
Estrela da Mogiana - Pela primeira vez, desde 2017, a delegacia de polícia de Jaguariúna tem uma mulher ocupando a posição de delegada titular. Até então, as delegadas que passaram pela unidade ocuparam o cargo apenas temporariamente. Além disso, as mulheres são minoria nessa posição. Na seccional, existem cerca de 15 delegados. Destes profissionais, apenas três são do sexo feminino. O que isso representa pessoalmente para a delegada?
Juliana Belinatti Menardo - Agora a gente vê mais mulheres nos concursos pra Polícia Civil. Está aumentando a procura. Acho que a mulher está se libertando, ficando mais corajosa com relação a algumas profissões. Antigamente as mulheres ficavam mais recolhidas. Agora a gente está procurando outros caminhos para se realizar profissionalmente. O aumento de interessadas na carreira policial também aparece na faculdade, com maior número de estagiárias de direito que têm vontade de trabalhar em delegacias.
Estrela da Mogiana - Podemos considerar que as mulheres evoluíram e conquistaram mais oportunidades no mercado de trabalho, independente da função?
Juliana Belinatti Menardo - As mulheres avançaram muito na questão de buscar uma igualdade de condições com relação aos homens. Eu, por exemplo, ocupo um cargo que antes somente era ocupado por homens. Porém, dados estatísticos, em iniciativa privada, ainda apontam que mulheres ganham menos que homens, mesmo que realizando funções idênticas. Com certeza isso demonstra que as mulheres ainda não atingiram a igualdade plena e isso é um problema sério a ser enfrentado.
Estrela da Mogiana - No ano passado, por sua iniciativa, com apoio da Prefeitura, foi instalado na cidade ao lado da delegacia, um setor dedicado especialmente ao atendimento de mulheres. Como surgiu o Setor de Proteção à Mulher da Delegacia Civil da cidade de Jaguariúna e com quais objetivos?
Juliana Belinatti Menardo - A ideia partiu da demanda de violência doméstica na cidade, e também da falta de uma delegacia especializada no assunto. É um setor mais especializado, com mais intimidade e aconchego. Iniciamos esse projeto para ter um atendimento digno à mulher. O departamento conta com funcionárias do gênero feminino, o que torna o ambiente mais apropriado na hora da vítima relatar os fatos. E além de atender as mulheres, o projeto visa abranger a violência doméstica de um modo geral, procurando também amparar crianças que são vítimas deste tipo de violência.
Estrela da Mogiana - Como a delegada observa historicamente o avanço das políticas públicas e das legislações no Brasil relativas à proteção das mulheres vítimas de violências?
Juliana Belinatti Menardo - A violência contra a mulher representa uma questão cultural no Brasil. O homem agride e acha que vai ficar por isso mesmo. A lei Maria da Penha, por exemplo, veio pra proteger essa impunidade presente no gênero feminino. Só que a gente percebe que a violência contra a mulher está enraizada na cultura brasileira. Por isso, acho que é uma questão de educação. Tem que mudar essa visão de mundo. Há muitos homens que agridem as mulheres, achando que vai ficar por isso mesmo. Acham que são donos delas, proprietários, mas não é bem assim. Ainda é um desafio a redução desse tipo de crime que, vale ressaltar, não assola somente o Brasil. Os crimes contra as mulheres, infelizmente, acontecem em todo o mundo, com registros também na Europa e Estados Unidos, ou seja, em países desenvolvidos.
Estrela da Mogiana - Mas a Lei Maria da Penha tem eficácia, na sua opinião?
Juliana Belinatti Menardo - A Lei Maria da Penha foi muito importante para a mulher brasileira porque tornou a punição de seu agressor mais certa e rigorosa, garantindo valores fundamentais, prevendo sanções firmes àqueles que desrespeitam a dignidade da mulher. Mas com o passar dos anos, essa mesma lei não tem sido suficiente para frear a violência doméstica, já que, na prática, essas ocorrências infelizmente têm sido recorrentes.
Estrela da Mogiana - Qual seria a solução, na opinião da delegada, para promover o combate à violência contra a mulher?
Juliana Belinatti Menardo - Acredito que um trabalho bem realizado de natureza multidisciplinar, entre setores da Educação, Saúde e Segurança Pública, no sentido de esclarecer, cuidar e proteger a mulher. Isso pode ser uma saída para que ocorra a redução. É importante frisar que o homem também deve ser foco desse trabalho para que, assim, o pensamento machista seja desconstruído com informações adequadas quanto a igualdade de direitos, inobstante à distinção de gêneros.
Estrela da Mogiana - O que diria especificamente às mulheres, no sentido de encorajá-las ao enfrentamento à violência?
Juliana Belinatti Menardo - Sempre incentivo a denúncia por parte das mulheres vítimas de violência doméstica. A Polícia e o Estado, como um todo, somente poderão ajudá-las se forem informados acerca do ocorrido. O aumento das ocorrências que não são notificadas à Polícia beneficia a violência e prejudica o enfrentamento dessa situação. E isso não pode acontecer.
Estrela da Mogiana - E qual sua avaliação sobre o perfil geral de ocorrências em Jaguariúna?
Juliana Belinatti Menardo - É uma cidade que tem crescido em termos populacionais. E, justamente por isso, possui uma complexidade de crimes que necessita não só de atenção, mas principalmente de um policiamento ostensivo e investigativo. Isso é fundamental.
Estrela da Mogiana - Quais são as atribuições legais que fazem parte da dinâmica de trabalho e atuação da Polícia Civil?
Juliana Belinatti Menardo - A Polícia Civil desempenha o papel de Polícia Judiciária e é a responsável pela investigação criminal. Quando um crime é cometido, é ela a responsável por elucidar esse crime, buscando o autor do delito, os vestígios deste crime e as circunstâncias em que ele ocorreu. Depois de tais elementos serem arrecadados de forma documental em um procedimento chamado inquérito policial, tais documentos são enviados à Justiça.
Estrela da Mogiana - Quais são as maiores dificuldades que a atual Polícia Civil enfrenta em termos de recursos?
Juliana Belinatti Menardo - Entre os 26 estados da União, São Paulo é o que mais prende e oferece pior salário para delegados no Brasil. No estado do Maranhão, por exemplo, o salário de um delegado é o dobro de São Paulo, sendo que o número de prisões no estado são maiores, ou seja, trabalha mais e recebe menos, com o mesmo tempo de carreira.
Estrela da Mogiana - Para encerrar, que recomendação ou conselho daria aos leitores que sonham em ingressar na Polícia Civil?
Juliana Belinatti Menardo - Além de estudar muito para os concursos e ser formado em Direito – para quem deseja especificamente se tornar delegado – os candidatos aos cargos de policiais, de uma maneira, geral, devem ter em mente que a carreira policial não é um emprego como outro qualquer. O policial não é um simples servidor público, com hora certa para entrar na repartição, e hora certa para sair. As características do seu trabalho são bastante peculiares. A ausência de uma rotina sempre igual, como ocorre normalmente nas Delegacias de Polícia, força o policial a se adaptar a quase todas as situações. É importante salientar que o trabalho policial verdadeiro nada tem a ver com aquilo que costumamos assistir em filmes hollywoodianos.
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